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O sionismo não é a única expressão política do judaísmo, afirma sociólogo Santiago Slabodsky

Dec 2, 2024 IDOPRESS
Manifestantes pró-palestinos ocupam degraus de um edifício no campus do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) — Foto: Sophie Park/The New York Times

Manifestantes pró-palestinos ocupam degraus de um edifício no campus do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) — Foto: Sophie Park/The New York Times

RESUMO

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GERADO EM: 01/12/2024 - 20:50

Críticas ao Sionismo e Antissemitismo: Reflexões de Santiago Slabodsky

O sociólogo Santiago Slabodsky critica o sionismo como representante do poder ocidental no Oriente Médio e propõe uma "Palestina Global". Destaca a complexidade do judaísmo e alerta sobre estereótipos antissemitas. Analisa a história do sionismo e sua influência na política atual. Discute a influência do Ocidente e a necessidade de uma mediação justa nos conflitos do Oriente Médio. Adverte sobre o antissemitismo estrutural e a instrumentalização política. Questiona a postura pró-Israel da extrema direita e o risco do sionismo cristão. Reflete sobre a necessidade de combater o antissemitismo em todas as esferas políticas.

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O presidente argentino,Javier Milei,já disse que gostaria de se converter ao judaísmo,publicou versos hebraicos da Torá em suas redes sociais e viajou a Israel para se encontrar com rabinos. Mas,para o sociólogo Santiago Slabodsky,seu conterrâneo,"tudo o que ele sabe sobre a cultura judaica são estereótipos antissemitas interpretados positivamente". No Brasil para participar do seminário "Memórias em disputa",na Casa do Povo,em São Paulo,o professor de Estudos Judaicos na Universidade Hofstra,em Nova York,e autor de "Judaísmo Decolonial" (em tradução livre),acusa de antissemita o sionismo professado por líderes evangélicos e de extrema direita,e defende a formação de uma "Palestina Global",para buscar uma solução justa para o conflito.

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Você propõe um judaísmo decolonial. Qual é a participação dos judeus no projeto ocidental?

O imperialismo moderno começou entre os séculos XVI e XVII com a conquista da América,a escravização dos africanos e a expulsão de judeus e muçulmanos da Europa. Os judeus foram vítimas desse sistema e,em alguns casos,colaboradores,porque o colonialismo precisa da colaboração dos oprimidos. Depois da Segunda Guerra Mundial,o Ocidente reconfigurou elementos antissemitas para incorporar o judeu,em oposição a outros povos,como o muçulmano.

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Você insiste que o sionismo é apenas um dos projetos políticos judaicos. Por que ele foi vencedor?

Quando o ideal de assimilação à civilização europeia fracassou,emergiu o sionismo político,que afirmava que a única possibilidade de os judeus terem expressão política era com um Estado próprio. Depois da Segunda Guerra,a comunidade judaica americana,próxima ao establishment,propôs um “nunca mais” para os judeus,defendendo que a única forma de impedir um novo Holocausto era por meio da obtenção de poder político. Houve dissidência,muitos judeus pediram um “nunca mais” para todos,porque o Holocausto não foi nem o primeiro nem o último genocídio. Para os poderes da época,interessava enfatizar o “nunca mais” para os judeus e estabelecer uma política ocidental no Oriente Médio,da qual Israel é o representante. É da natureza do Ocidente incorporar suas antigas vítimas para continuar seus genocídios.

Havia inspirações socialistas na criação de Israel. Como esse projeto acabou na extrema direita de Benjamin Netanyahu?

Até os anos 1970,Israel foi governado pelo socialismo trabalhista,e depois veio a direita. Mas a política de Estado sempre foi a mesma: privar os palestinos de existência política. De um lado,o projeto é de eliminação da consciência política,do outro é eliminação física. O trabalhismo até tentou incluir os “árabes”,mas transformando-os em cidadãos de segunda ou terceira classe.

O sociólogo argentino Santiago Slabodsky,professor de Estudos Judaicos — Foto: Divulgação

O Sul Global pode contribuir com a mediação dos conflitos no Oriente Médio?

A mediação do Ocidente nunca foi neutra,sempre foi interessada. Por sua relevância econômica e política,o Brasil poderia intervir. Mas o Ocidente vai deixar? Só se o interesse ocidental for realmente solucionar o conflito e não tirar proveito dele. O teórico palestino Mitri Raheb fala em “Palestina Global” e “Israel Global”. Segundo esses conceitos,depois dos Acordos de Abraão,os Emirados Árabes Unidos e o Bahrein são parte do Israel Global,enquanto muitos no Sul Global,incluindo muitos judeus,pertencem à Palestina Global,porque sabemos o que é ser perseguido e ter sua consciência política negada. Por isso,me solidarizo com os palestinos,que têm direito a sua terra. Isso não quer dizer expulsar os israelenses,mas afirmar que aquela não deve ser uma terra de supremacia judaica.

Foi anunciado um cessar-fogo entre Israel e o Hezbollah,no Líbano,mas ambos os lados já se acusaram de romper o acordo. Há chances de uma trégua permanente?

Há um interesse de certas partes em continuar o conflito. Embora possa haver,em algum momento,um cessar-fogo temporário que seja conveniente por motivos específicos,o projeto de longo prazo não permite que se alcance uma paz justa.

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A postura pró-Israel de Milei pode afetar o apoio da América Latina à causa palestina?

Tudo o que Milei sabe sobre judaísmo são estereótipos antissemitas que ele entende como positivos: o judeu cosmopolita e sem pátria,o judeu capitalista e rico,que só pensa em dinheiro. Seu filossemitismo é antissemita,ignora as lutas judaicas por justiça social e tem mais a ver com interpretações evangélicas do que com o judaísmo em si. Milei é homem fora do tempo,suas posições econômicas são dos anos 1950 e não funcionam mais. Temo pelos argentinos. Mas temo ainda mais pelo mundo no caso de uma eventual volta de Jair Bolsonaro ao poder,porque ele tem mais influência.

Como o senhor avalia o sionismo cristão professado pela extrema direita?

O sionismo cristão se apoia numa leitura débil da Bíblia,acredita que é preciso que os judeus se reúnam em Israel para Jesus voltar e ocorrer o Juízo Final,no qual os não cristãos serão exterminados. É profundamente antissemita,mas é politicamente conveniente. O que acontecerá se eles desistirem de esperar a volta de Jesus e já começarem o extermínio dos que não estão de acordo com eles? Essa visão é um risco para os judeus e todos os que não estão de acordo com o Ocidente cristão.

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A guerra em Gaza fez crescer tanto o antissemitismo e o antissionismo quanto as acusações de que o antissemitismo tem sido instrumentalizado para proteger Israel de críticas. Qual é a sua avaliação?

O objetivo do seminário em São Paulo é combater o antissemitismo e a instrumentalização política do antissemitismo. A associação entre antissemitismo e antissionismo,por exemplo,sacrifica as comunidades judaicas do mundo todo em nome de um Estado-nação,como se o sionismo fosse a única possibilidade de os judeus se expressarem politicamente,quando é só um dos vários projetos políticos judaicos. Isso não quer dizer que não haja antissemitas entre os antissionistas,porque há. O antissemitismo é parte do Ocidente cristão,existe na esquerda,no centro e principalmente na direita.

Hoje a esquerda é mais acusada de ser antissemita do que a direita...

Assim como o racismo e a islamofobia,o antissemitismo é parte estrutural do Ocidente e tem de ser combatido o tempo todo. O maior ataque antissemita dos EUA [a uma sinagoga em Pittsburgh,em 2018,que deixou 11 mortos] não foi perpetrado por estudantes pró-Palestina,mas por um radical de direita,que acreditava em teorias conspiratórias e invadiu um templo que ajudava refugiados da guerra na Síria. Onde está o risco real? Nos estudantes pró-Palestina ou na direita organizada e armada?